1641 a 1660

1642

Apesar do episódio de Amador Bueno, espanhóis e portugueses continuaram a viver tranquilamente em São Paulo, uns ao lado dos outros, perfeitamente solidarizados. Ocorreu, porém, certa reação nacionalista, insuflada de Portugal. Na sessão de seis de dezembro de 1642 dizia-se em Câmara que em virtude de expressas ordens emanadas da Coroa nenhum estrangeiro podia exercer cargo público. João Martins de Heredia, no entanto, embora houvesse sido vereador de São Paulo em 1641 e agora exercesse o cargo de capitão-de-aldeia não queria, apesar de espanhol, deixar seu posto, pelo que sofreu a intimação da Câmara a que se demitisse.

1645

Era a vida econômica dos colonos seiscentistas perturbada por uma série de medidas administrativas ineptas e odiosas. Às extorsões do regime tributário, organizado sobre bases, as mais absurdas, vinham agravar os privilégios. A princípio não havia dinheiro senão nas capitais e esse mesmo só nas mãos dos homens ricos e dos grandes traficantes. No interior não se conhecia moeda, praticamente. Em 1645 estabeleceu Salvador Correia de Sá e Benevides uma Casa da Moeda na vila a fim de cunhar o ouro das pequenas faisqueiras (lugar onde se encontram algumas faíscas de ouro) dos arredores como as do Jaraguá e Vuturuna assim como as de Iguape e Cananéia e ainda as de Paranaguá.

Muito natural, pois, em região de tanta terra e tão pouca gente pouco valesse a propriedade imobiliária em desproporção enorme com os preços das utilidades. Os próprios prédios urbanos pouco significavam numa época em que eram o fruto do labor escravo e quando não se fazia conta do emprego do tempo. Um vestido de seda ou de veludo valia quase tanto quanto uma casa mediana seiscentista. As propriedades rurais circundantes da vila não constituíam geralmente latifúndios como os entendemos hoje. Às casas rurais acompanhavam as olarias e toscas oficinas de carpintaria, ferraria, selaria, sapataria. A fiação e tecelagem se reservavam às mulheres. Nos prédios urbanos escassos se apresentavam o mobiliário constante de toscos catres e tamboretes, raras cadeiras de estados e algumas rasas, mal ajambrados bufetes e vastas e rudes arcas. E o aparelhamento da casa vinha a ser o mais sumário em matéria de louça, trem de cozinha, serviços de mesa como em todo o Brasil se dava até o século XIX.

1650

Crescia a vila: já apareciam os ofícios especializados, outrora incompatíveis com a rudeza e primitividade da vida. A 30 de março de 1650, menciona-se a existência de um “espadeiro”, também azulador, isto é, sabendo dar o matiz azulado dos aços de fina têmpera. 

1651

Fernão Dias Pais é eleito juiz ordinário e presidente da Câmara Municipal de São Paulo e reconstrói a abadia dos beneditinos.

1653

Os jesuítas retornam a São Paulo após 13 anos de exílio e iniciam a construção do novo conjunto igreja e colégio. Infatigáveis educadores, cabia aos jesuítas quase que a universalidade da atuação em prol do ensino do País.

No século XVII, segundo o depoimento, aliás lacônico, de Simão de Vasconcelos, deviam as aulas do Colégio de São Paulo ter sido primárias. Mas tal o prestígio dos alunos do colégio que vemos nos inventários do tempo alegrarem as autoridades jurídicas que este e aquele testamento fora redigido por “estudantes do colégio”.

Nas aulas da Companhia, únicas no abandono em que a instrução pública vivia, ensinavam abalizados professores. Graus científicos, literários e teológicos se atribuíam aos que completavam o curso, sendo o título de mestre em artes, tão apreciado quanto prestigiado.

Nos cenóbios, sobretudo no Colégio, existiam esboços de livraria. Já em 1653 havia quem em São Paulo encadernasse livros! No inventário de Pedro Fernandes surge um “torno de emprensar livros” avaliado em 320 réis.

1654

A 23 de maio comentava-se que todos os caminhos “das serventias por esta villa e pera o mar estavão tapados e não havia quem por elles pudesse passar”.

1655

Houve pelo menos um paulista do século XVII retratado; o afamado Redentor da Pátria: Francisco Nunes de Siqueira, o negociador, em 1655, do primeiro acordo entre Pires e Camargos. “Por este merecimento lhe tributou a Pátria, di-lo Pedro Taques, uma obsequiosa lembrança, fazendo-o retratar com verdadeira efígie do mesmo modo com História da Cidade de São Paulo que fez a sua pública entrada que foi a cavalo, vestido de armas brancas, em sela hierônima, com lança ao ombro, bigodes à Fernandina.”

Perdeu-se este retrato eqüestre, preciosíssimo documento da nossa arte primitiva.

1656

As propriedades no centro da vila ficavam frequentemente devolutas. Assim se deu a doação ao Capitão Luís Rodrigues Duarte servidor de Sua Majestade nas guerras de Pernambuco dos terrenos solicitados “não sendo dados a outrem” para neles fazer casa onde vivesse. A 20 de novembro de 1656 pôs-se o alcaide a passear pela rua a clamar: Posse! Posse! Uma e muitas vezes. Depois disto Luís Rodrigues dentro dos desejados chãos por três vezes gritou: Posse! Como ninguém nada objetasse a este cerimonial singelo ficou o capitão das guerras de Pernambuco senhor daquilo a que pretendia.

1657

Desde 1657 tinha a vila mestre de capela em sua matriz, o que implica certamente a existência de coro, embora desacompanhado de órgão ou realejo e quiçá; apenas apoiado por alguma harpa ou cítara.

A arte pictórica do planalto só podia ser o que foi, pobríssima ou, antes, nula. Com a inópia dos elementos essenciais da vida rude coetânea, onde achar terreno para uma eflorescência artística?

Retrato algum de paulista do século XVII subsistiu à devastação do tempo. Pelo menos ao que saibamos. E mais provável é que pouquíssimos filhos de São Paulo se hajam retratado, tal a dificuldade da reprodução pictórica, pela carência de artistas.

1660

Apaziguadas as lutas civis, pelo acordo de 25 de janeiro de 1660, resolveram os paulistanos, inspirados pelo seu pacificador o Ouvidor- Geral Dr. Pedro de Mustre Portugal comemorar a volta dos dias de bonança, por meio da fatura de grande obra de utilidade pública: o restabelecimento do Caminho do Mar.