1581 a 1600

1581

Ao longo da década de 1580, as estratégias de guerra e de defesa dos moradores estiverem no cerne das preocupações dos camaristas de São Paulo. O cenário era bastante complexo e tumultuado, com alianças dinâmicas e versáteis entre diversos grupos indígenas da vila e do sertão, que promoviam revoltas, mortes e guerras. Os adventícios, por sua vez, aliados à facção dos Tupiniquim, fomentavam guerras de conquista para expropriar os territórios indígenas e apresar índios como escravos, incitando revoltas indígenas. 

Buscando “aquietar a terra”, a Câmara procurou isolar os índios aldeados do contato com os homens brancos através de algumas medidas: 

1º) proibiu os colonos de irem às aldeias resgatarem índios, “p.r causa dos muitos agravos que lhe fazem”; 

2º) proibiu qualquer homem cristão branco de ficar em “aldeã de negros foros ou cativos bebendo e bailando ao modo do dito jentio”; e, por fim, 

3º) proibiu os brancos de fazerem casas nas aldeias dos índios e em seus arrebaldes, pelos “agravos que se fazem aos imdios na dita aldeia assim a de rirai e a dos pinheiros” 

1582

Em torno das fontes e lavadouros aglomeravam-se os escravos e o rapazio irrequieto. Os poderes públicos tentavam domar os malefícios do jogo: “Dar mesa de jogo e tavolagem nos dias de fazer” tornava os viciados passíveis de multa.

1583

A Câmara avocava a si o cuidado da vigilância dos forasteiros, exercida pelos alcaides. Em 1583 ordenava-se a prisão de uns tantos espanhóis que pretendiam incorporar se à comunidade paulistana e homens de atitudes suspeitas.

A primeira cadeia paulistana fixa só surgiu na era seiscentista. Mandava a edilidade tomar provisoriamente a casa deste ou daquele morador, para nela encerrar os criminosos, como, em 1583, sucedia ao se declarar que o ergástulo anexo ao paço tinha “cumeira podre comida de bicho e caruncho”. Nem sequer dispunham os carcereiros de ferros de contenção.

Em trinta anos notavelmente se civilizara a vila. Aumentou muito a produção local do vinho e marmelada. Nela reinava contudo grande deficiência de pano.

O colégio já tinha aspecto vultoso e a sua igreja, embora pequena, dispunha de bons ornamentos.

Em 1583 declarava o procurador Álvaro Neto que a vila passava de cem moradores.. Em torno do vilarejo multiplicavam-se as pequenas fazendas.

O escasso ouro obtido do flancos do Jaraguá mostrava-se insuficiente para o giro comercial. O comércio, rudimentar, como só podia ser, fazia-se por meio de escambo. Em 1583 denunciava-se em Câmara que vinham à vila mascates vendendo fazenda por preço desconveniente com muito prejuízo da terra cuja moeda corrente consistia em mantimentos, carnes, cera e gado, bois, vacas e porcos, pano de algodão, resgate (escravos) “porquanto na vila não havia outra fazenda”.

1585

Relatava Anchieta que a vila contava com 120 fogos (famílias) de portugueses.

Nela reinava a maior abundância de víveres, fabricava-se muita marmelada e muito vinho. Vinham as importações, sobretudo de Portugal e de Buenos Aires. Do Reino chegavam principalmente sal, panos, papel, medicamentos, objetos de ferro e aço; de Buenos Aires lãs, assim como alguns artigos da indústria européia.

O açúcar, o grande gênero do Brasil dos três primeiros séculos, era escasso, já que a frialdade do planalto e as geadas tornavam-se mortíferas à cana. Em 1585 os paulistanos fabricavam açúcar rosado com rosas de Alexandria.

Surgem os diversos ofícios ou corporações com os respectivos juízes, bandeira e regimento: os dos sapateiros, alfaiates, tecelões, ferreiros, carpinteiros, oleiros. Havia por vezes acúmulo de funções. Assim os alfaiates eram às vezes, e ao mesmo tempo cabeleireiros e barbeiros.

O Colégio já era “casa bem acomodada com um corredor e oito cubículos ao lado da igreja” e dispunha de oficinas bem instaladas. E Anchieta em 1585 dizia a seu Geral que São Paulo “terra de grandes campos era fertilíssima de muitos gados, de bois, porcos e cavalos”.

O vencimento da muralha paranapiacabana exigia grande esforço dos primeiros povoadores. No caminho, marginal de profundos despenhadeiros, Anchieta relatou que subiam e desciam os homens “com trabalho e às vezes de gatinhas”. Por tal estrada “podiam subir nenhuns animais”.

A conserva de caminho, pontes e aterrados eram realizados pelo processo de requisição de serviços entre os moradores contribuindo cada qual como o número de escravos de que podia dispor.

CRÔNICA DE FERNÃO CARDIM SOBRE A SÃO PAULO DE 1585
(Fernão Cardim, “Tratados da Terra e Gente do Brasil”, págs. 312, 313, 314 e 315)
"Ao dia seguinte vieram os principais da vila três léguas receber o padre. Todo o caminho foram escaramuçando e correndo seus ginetes, que os têm bons, e os campos são formosíssimos, e assim acompanhados com alguns vinte de cavalo, e nós também de cavalo, chegamos a uma Cruz, que está situada sobre a vila, adonde estava prestes um altar debaixo de uma fresca ramada, e todo o mais caminho feito um jardim de ramos... Fomos em procissão até a igreja com uma dança de homens de espadas e outra dos meninos da escola; todos iam dizendo seus ditos às santas relíquias.

Piratininga é uma vila da invocação da conversão de São Paulo; está do mar, pelo sertão dentro, doze léguas; é terra muito sadia, há nela grandes frios e geadas e boas calmas, é cheia de velhos mais que centenários, porque em quatro juntos e vivos se acharam quinhentos anos. Vestem-se de burel e pelotes pardos e azuis, de pertinas compridas, como antigamente vestiam. Vão aos domingos à igreja com roupões ou berneos de cacheira sem capa. A vila está situada em bom sítio ao longo de um rio caudal.

Terá cento e vinte vizinhos com muita escravaria da terra, não tem cura nem outros sacerdotes senão os da Companhia, aos quais têm grande amor e respeito, e por nenhum modo querem aceitar cura. Os padres os casam, batizam, lhes dizem as missas cantadas, fazem as procissões e ministram todos os sacramentos, e tudo por sua caridade; não tem outra igreja na vila senão a nossa.

Os moradores sustentam seis ou sete dos nossos, com suas esmolas, com grande abundância: é terra de grandes campos e muito semelhante ao sítio de Evora na boa graça e Campinas, que trazem cheias de vacas, que é formosura de ver. Têm muitas vinhas e fazem vinho e o bebem antes de ferver de todo; nunca vi em Portugal tantas uvas juntas, como vi nestas vinhas; tem grandes figueiras de toda sorte de figos bersaçotes, beberas e outras castas, muitos marmeleiros, que dão quatro camadas, uma após a outra, e há homem que colhe doze mil marmelos, de que fariam muitas marmeladas; tem muitos rosais de Alexandria e porque não tem das outras rosas, das de Alexandria fazem açúcar rosado para mezinha, e das mesmas cozidas, deitando-lhe a primeira água fora, fazem açúcar rosado para comer e fica sofrível; dá-se trigo e cevada nos campos: um homem semeou uma quarta de cevada e colheu sessenta alqueires; é terra fertilíssima, muito abastada: quem tem sal é rico, porque as criações não faltam.

Tem grande falta de vestido, porque não vão os navios a São Vicente, senão tarde e pouco; há muitos pinheiros, as pinhas são maiores, nem tão bicudas como as de Portugal: e os pinhões são também maiores, mas muito mais leves e sadios, sem nenhum extremo de quentura ou frialdade, e é tanta abundância que grande parte dos índios do sertão se sustentam com pinhões; dão-se pelos matos amoras da silva, pretas e brancas, e pelos bredos, beldroegas, almeirões bravos e mentrastos, não falo nos fetos, que são muitos e de altura de uma lança se os deixam crescer. Em fim, esta terra parece um novo Portugal.

Os padres têm uma casa bem acomodada, com um corredor e oito cubículos de taipa, guarnecida de certo barro branco, e oficinas bem acomodadas. Uma cerca grande com muitos marmelos, figos, laranjeiras e outras árvores de espinho, roseiras, cravos vermelhos, cebolas cecêm, ervilhas, borragens e outros legumes da terra e de Portugal. A igreja é pequena, tem bons ornamentos e fica muito rica com o Santo Lenho e outras relíquias que lhe deu o padre visitador.”
1586

O paço municipal é consertado. O pelourinho ergueu-se depois de 1586.

1587

A marmelada foi objeto de grande comércio naqueles anos. Era tanta, que a levavam a vender a outras capitanias. 

A criação dos suínos também prosperava extraordinariamente. Os porcos paulistanos eram abundantíssimos e notáveis pelo tamanho, “animais de carnes muito gordas e saborosas, fazendo vantagens às das outras capitanias por provirem de terra mais fria”.

Manadas de cavalos viviam errabundas pelos campos. À noite, soltos pelas ruas da vila, transitavam bovinos e eqüinos.

Nem todos os grupos indígenas que vieram do sertão para a vila foram descidos à força pelos paulistas ou capturados em guerra. Em 1587, o procurador da vila de São Paulo noticia a chegada voluntária de “hus índios tupiães [que] vinhão do sertão desta capitania pelo caminho de paz e per sua vontade p.a povoare a tera”. Em 1593, outro índio, chamado Vrapepoquira, saiu da aldeia de Jibarapara para a vila com a sua mulher e filhos em paz e na condição de forros. Os oficiais recomendaram que fossem viver em aldeias de índios cristãos

Em 1587 declarava o Procurador Afonso Dias que a “vila possuía mais matos que outra coisa”.

1588

A igreja do Colégio cujo orago era São Paulo, vinha a ser então o único templo da vila. Mas os paulistanos desejavam ter matriz. Passados dos mais de trinta anos de fundação da vila cogitaram de edificar a “Hygreja Matriz”, reza uma ata de 1588, com “Viguario e quagytor e hornamentos e sino e todo ho mais necessários ao culto devino”.

No respeito à hierarquia social residia uma das preocupações municipais. Initium sapientiae timor regis inculcavam as medidas de 7 de abril de 1588. “Nenhuma pessoa, de qualquer sorte e qualidade seja ousado de pôr boca a El Rey Nosso Senhor nem em suas justiças”. Isto sob pena de fortíssima multa (1$000rs.) cadeia e degredo por um ano no forte de Bertioga. Aos peões aplicar-se-iam como sobrecarga cem chibatadas vigorosas.

1589

Fundada a Paróquia da Freguesia da Sé. A Câmara alegava ao Governador-Geral do Brasil que a sua vila era passante de cento e cinqüenta fogos e ia aumentando.

A superintendência da polícia de costumes procurava pôr cobro às orgias e desordens de índios e brancos. Estavam estes expressamente proibidos de comparticiparem dos folguedos do gentio e das suas tapuiadas.

Em 1589 declarava a Câmara “estar a vila em piriguo de imundicies que era piriguo do povo” por ocasião de uma das terríveis epidemias das “begigas” dizimadoras das indefesas populações coloniais.

A Câmara de 1589 alegava ao Governador-Geral do Brasil que a sua vila contava com mais de cento e cinqüenta famílias e que esse número ia crescendo.

1590

Em 1590 ia a vila tomando melhor aspecto. Às cobertas de sapé entremeavam-se os tetos de telha. E o Colégio já tinha certa aparência vultosa.

Terra sem açúcar, sem um produto de forte utilidade mundial, teria São Paulo de viver na pobreza quando os outros núcleos principais do Brasil, Bahia e Pernambuco sobretudo, dispunham de muito maiores cabedais. Várias tribos acamparam em Barueri com grande número de arcos e em certa ocasião fizeram uma incursão até Pinheiros onde queimaram a ermida local. Mas não se atreveram a avançar sobre a vila a que comandava Afonso Sardinha.

O paço municipal estava em 1590 muito abalado pelos estragos causados pelo gado solto a pastar pela vila.

Ao cair da noite ficava a vila imensa na treva, ao bater a sineta do Colégio o toque de abafar.

Em 1590 proibia a Câmara: “negro nem branco tragua de noite foguo pela vila’’: “ninguém se entenderá de um vizinho hum para outros e fronteiro”.

1591

Em 1591, frei Antônio de São Paulo pediu à câmara municipal licença para a fundação de um convento Carmelita. Encontrou, porém, diversas dificuldades, de modo que só em 1594 foi possível realizar o seu intento.

Diante dos assaltos dos Tupiniquim, da visão dos “fumos no caminho do sertão” e do receio de “vir gente de paraopava para ajudar os índios “inimigos”, o capitão Jerônimo Leitão resolve empreender uma guerra campal aos Tupiniquim e construir um forte em Ambuaçava, “remédio, ampairo e vigia dos enemigos”. Quinze homens estavam encarregados da defesa e, a cada dia, dois homens deveriam se embrenhar no mato como espias com alguns índios e escravos. De acordo com a ata, os “vigias ãdarão no mato todo hu dia e dormirão la hua noite e pela manhã virão a dar rezão do qu se achar nesessario”[...].

Em 1591, Jerônimo Leitão havia feito uma cerca na Ambuaçava de taipa de pilão e os oficiais pediram que o capitão “puzesse gente na dita serqua e mãdase defender p.r q hos contr.os não se metese nella”.

Era D. Francisco de Sousa, senhor de Beringel, e sétimo Governador- Geral do Brasil, em 1591, personalidade certamente de invulgares dotes de inteligência e energia. Veio para o seu governo disposto a executar largo programa que visava sobretudo impulsionar as expedições da devassa do sertão  e da descoberta de jazidas de metais nobres.Profunda impressão causou aos seus governados em qualquer ponto do Brasil em que permaneceu.

1592

O Padre Lourenço Dias Machado, vindo de Angola, era nomeado vigário. Tal era a falta de dinheiro que, em 1592, pagava a Câmara vencimentos ao seu porteiro em palha. Como os cidadãos se queixassem de que os rendeiros da carne verde recusavam entregá-la a troco dos produtos da terra, exigindo moeda, frequentemente intervieram os poderes municipais obrigando os contratadores a trocar o seu gênero por algodão, cera e marmelada.

Os oficiais da Câmara informam que os índios da aldeia de São Miguel e demais aldeias estavam “arruinados” e pediam para os juízes, vereadores, o vigário e o escrivão da vila de São Paulo que fossem até a aldeia para tratar de “couzas pertensentes ao bem da cap.ta” e requeriam “tirar devassa cotra todos aquelles q forão em amotinarem os ditos índios” e que, no dia de São Miguel se “querião levãtar contrários”. É surpreendente que, no final do século XVI, os índios da aldeia de São Miguel tenham articulado o pedido de uma devassa diante das autoridades coloniais para que investiguem os responsáveis pelas revoltas dos índios aldeados.

Apesar das dificuldades enormes impostas pela Serra do Mar, a expedição dos gêneros do planalto se fazia ativa por meio de carregadores índios.Os principais gêneros exportados eram farinha de trigo, carne salgada, sobretudo de porco, e marmelada. Os trigais prosperavam, admiravelmente, em torno da vila onde também se plantava cevada e havia vinhedos dando abundante vinho. Já em fins do século XVI requisitavam os Governadores-Gerais farinhas como em 1592, D. Francisco de Sousa, a solicitar uma remessa de oitocentos alqueires para Pernambuco.

Procissões se efetuavam regularmente. A princípio três principais: a de Corpus Cristi, a mais solene, a da Visitação de Nossa Senhora e a do Anjo Custódio do Reino. Na época das grandes festas e procissões ordenava os edis a roçada geral dos quintais e testadas. 

1594

Em 1594 estabeleceu-se na vila a segunda de suas “religiões” a Ordem de Nossa Senhora do Carmo.

O paço municipal foi novamente consertado.

Em 1594 a Câmara proibia que “ninguém armasse casa nem alicerçasse” sem sua permissão. E, fato, sobremodo curioso, proibia-se ao mesmo tempo sob grave multa o corte de pinheiros.

Em 1594 Domingos Luís, o Carvoeiro levantava um correr de casas de dois pisos em frente à matriz.

1597

Em todo o século XVI não se constata a existência de clínico algum em São Paulo. Em 1597 instalava-se o primeiro serviço médico sanitário com a nomeação do barbeiro Antônio Roiz para juiz do ofício dos físicos. Era homem experimentado e examinado e não um daqueles empíricos que “na vila curavam feridas e faziam sangrias por toda a terra”.

1598

A câmara obteve, em 1598, nova área de rocio melhor localizada. Dentro dela fazia concessões. Doava prazos onde os moradores pudessem fazer quintal e benfeitorias.

Alegavam os requerentes, freqüentemente, ter ajudado a defender a terra através de numerosos “perigos e frechadas”. “E hora havendo respeito guasar na tera, etc.’’ Estas concessões obrigavam os beneficiários ao pagamentos de foros à Câmara, quantias aliás mínimas.

Em 1598 o procurador Pedro Nunes denunciava que tais animais “faziam muitas perdas às casas e benfeitorias e se caíam muitas paredes”.

D. Francisco de Sousa organizou em São Paulo verdadeiro departamento mineiro. À sua frente, em 1598 despachou Diogo Gonçalves Laço administrador de tal organização, acompanhado de dois técnicos prospectores, um mestre fundidor e mais duzentos índios para a laboração das minas. Era grande a expectativa dos vassalos em torno de sua chegada.

1599

Outra medida civilizadora, a de janeiro de 1599, – quando o Procurador Francisco Maldonado propôs o estabelecimento de, pelo menos, uma estalagem “é necessário que aja nesta vila quem venda cousas de comer e beber que viva por isso. E onde poudesem pousar os forasteiros”.

O suprimento de carne a população fazia-se irregularmente e apesar da abundância dos bovinos. Freqüentes as reclamações dos cidadãos às Câmaras ao alegarem “morrer de fome por não haver quem quisesse matar carne”. A 15 de janeiro de 1599 resolviam os edis “que se fizesse casa para açougue” onde se talhasse a carne “a fim de que esta não andasse a vender pelas ruas, de casa em casa, como até então fora de costume”.

Em princípios de 1599 apareceu D. Francisco de Sousa em São Paulo acompanhado de vultoso séquito militar e civil.

Causou verdadeira revolução de costumes entre os seus governados de Piratininga como nos conta o nosso Heródoto, Frei Vicente do Salvador, a acrescentar “se se havia D. Francisco pagado da Bahia muito mais se pagou de São Paulo”.

Modificou profundamente o aparelhamento administrativo da vila, dando-lhe outra amplidão, criando e provendo cargos, tornando a capital, de fato, da capitania vicentina, dela fazendo a sede do fórum regional.

1600

Até 1600 não atingiria a população de São Paulo talvez a duas mil almas, entre brancos e escravos.  Em torno do vilarejo multiplicavam-se as fazendolas.

Já a certa distância se estabelecera Manuel Fernandes em Parnaíba, com os filhos, os três famosos povoadores, que, durante anos, foram os fronteiros mais profundamente entranhados no hinterland brasileiro.

Rio Tamanduateí

"Tamanduateí" é um termo de origem tupi que significa "rio dos tamanduás verdadeiros", através da junção dos termos tamandûá (tamanduá), eté (verdadeiro) e 'y (rio) .

De 35 quilômetros de extensão, o Rio Tamanduateí (que os antigos sertanistas chamavam de Rio Piratininga) nasce cristalino no município de Mauá, passa pelas cidades de Santo André e São Caetano, atravessa o centro de São Paulo, no Parque D. Pedro II, até desaguar no Rio Tietê, no bairro do Bom Retiro, em frente ao Palácio das Convenções do Anhembi.

O Tamanduateí era  um rio bastante sinuoso que cumpriu importante papel na formação da cidade de São Paulo, permitindo a navegação até o Rio Tietê e facilitando a locomoção dos moradores e dos sitiantes que residiam nas vizinhanças. Teodoro Sampaio escreve sobre a navegação no Tietê e no Tamanduateí no final do século XVI: "Embarcados na sua canoa o padre, o negociante, o fazendeiro, o simples homem do povo podiam atingir qualquer ponto da zona povoada em torno de São Paulo".

Margem direita do rio Tamanduateí no fim do século XIX.
O Tamanduateí, até o início do século XX, foi um via de transporte fluvial, atendendo os Mercado Grande (ou Mercado Velho) e o Mercado dos Caipiras que existiam na antiga Rua de Baixo (atual 25 de Março), quando barcos transportavam mercadorias até o porto denominado de Ladeira Porto Geral.

Além disso, as suas águas, que corriam limpas, eram utilizadas para os afazeres domésticos dos moradores. Em sua várzea, ao lado das pontes, as mulheres, com trouxas e tábuas, lavavam as roupas. “Lavar a roupa suja” e “briga de lavadeira” são expressões vindas de um tempo em que o rio Tamanduateí era um lugar de encontros e também de desencontros. Vindas de diversas partes da cidade em sua maioria negras, depois viriam imigrantes do Brás, as lavadeiras se encontravam, e, apesar do trabalho estafante também trocavam impressões pela vida. Não raro saiam brigas pelos melhores pontos de lavagem, fofocas maldosas, assim como amizades e risos das moças e senhoras pobres que utilizavam as águas do rio.

As lavadeiras registradas pelas lentes de Guilherme Gaensly, em postal circulado em 1904.
Ao fundo, vemos a antiga Ponte do Carmo, que fazia a ligação da Ladeira do Carmo com o
Caminho do Brás (atual Rangel Pestana), ao fundo vemos a torre da Igreja do Carmo.
Os homens pescavam e os animais bebiam água. Descreve o jornalista Geraldo Sesso Jr.:

"Na época das enchentes era muito comum divisar-se naquele local, tarde à noite como durante o dia, numerosas pessoas que ali iam pescar e caçar frango d'água, patos selvagens e rãs. Na época de piracema, em que cardumes de rios procuravam subir rio acima, o número de pescadores aumentava consideravelmente. Estes usavam redes e havia outros que, na falta desse apetrecho de pesca, usavam até guarda-chuvas". 

As casas cujos fundos abriam-se para o Rio Tamanduateí tinham escadarias onde os moradores atracavam seus barcos e pescavam. No fim da Ladeira Porto Geral, antigo Beco das Barbas, existiu de fato um porto - daí o nome da rua -, que resistiu até o início do século XX, quando o prefeito Antonio Prado mudou o curso do rio e o reduziu a um estreito canal.

Região da rua 25 de março, em 1890.

Bem antes de ser o Parque D. Pedro II, toda essa região era conhecida como Várzea do Carmo. Várzea, pois era (ainda é) a área inundada pelas cheias do Tamanduateí e “do Carmo” por conta da igreja dos carmelitas, a Igreja do Carmo, que também nomeava a ladeira e a ponte no final dela, hoje esse trecho corresponde a conhecida avenida Rangel Pestana.

Por muito tempo, usou-se as margens do Tamanduateí para para banhos, para as lavadeiras e suas memoráveis brigas e também para o despejo de lixo e de dejetos. As enchentes passaram a ser um dos grandes problemas à população, pois a insalubridade da Várzea do Carmo trazia muitas doenças para a população.

Já em 1810 fora construída uma vala no centro da várzea na tentativa de barrar os alagamentos. Mesmo com esses problemas, o botânico francês Auguste Saint-Hilaire¹, que esteve em São Paulo em 1822, dá um panorama da vista que se descortina pelas janelas do Largo do Palácio (Pátio do Colégio):

“o Tamanduateí vai serpenteando através das pastagens úmidas, [dava] mais encanto à paisagem.” Esta paisagem, por sinal, incluía a Várzea do Carmo, atual Parque D. Pedro II, a qual ele definiu como uma “planície sem acidentes que apresenta uma encantadora alternativa de pastagens rasteiras e de capões de mato pouco elevados [...] nas partes em que há mais água, o solo é entremeado de montículos cobertos de espessos tufos de relva.”

“Innundação da Várzea do Carmo”, 1898, Pintura de Benedito Calixto.
No canto direito, é possível ver parte do antigo colégio, usado como Palácio do Governo.
Do lado esquerdo, essa construção com um grande pátio é o antigo
Mercado dos Caipiras (ficava no final da Rua Municipal, atual General Carneiro).


A Província de São Paulo. 7 de março de 1877.

Entre as décadas de 1870 e 1880, o rio Tamanduateí foi um dos pontos de lazer do paulistano, quando a "Ilha dos Amores", que era uma pequena ilhota ajardinada existente nas proximidades da atual Rua 25 de Março, mantinha quiosques com bebidas e comidas, além de uma casa de banho e espaço para o descanso, permitindo, assim, um local de entretenimento e lazer para a população, estimada nesta época em 31 mil habitantes conforme o censo de 1872. Após vários alagamentos, a ilha foi abandonada e deixou de existir no início do século XX, quando ocorreu a segunda retificação do rio.

Vista do rio Tamanduateí, entre os bairros da Luz e do Pari, região central de São Paulo, em foto de 1906

Rio Tamanduateí na região da rua 25 de março, em 1910.

Mas o desastre ambiental começa na década de 1950 com a construção de um pólo petroquímico em Capuava, que resultou em danos irremediáveis ao rio: a construção de uma barragem e a poluição de suas águas com dejetos químicos.

O Tamanduateí possuía 43 afluentes que deram origem a bairros, vilas e cidades, como o Ipiranga, a Mooca e a Pedra Branca. Atualmente a maioria desses córregos encontra-se total ou parcialmente canalizada e transformada em canais coletores de esgoto; o próprio rio tornou-se o maior canal de esgoto a céu aberto do ABC paulista. 

Mosteiro de São Bento

A fundação do Mosteiro de São Bento data de 14 de julho de 1598. Segundo documentação da época, foram concedidas duas sesmarias pelo Capitão-Mor Jorge Correia, as quais seriam a base da fundação beneditina na pequena vila.

O terreno cedido a São Bento era o mais bem localizado, depois daquele do Colégio dos Jesuítas, ficando exatamente no alto da elevação, entre as águas do Anhangabaú e do Tamanduateí, abrangendo de um lado até o Vale do Anhangabaú e, do outro, até a atual 25 de Março, inclusive.

O mosteiro teve como fundador um paulista de nome Simão Luís, nascido em São Vicente, o qual mais tarde passou para a história, com o nome de Frei Mauro Teixeira. Discípulo do Padre José de Anchieta, que ingressou no Mosteiro de São Bento da Bahia, depois de sua família ter sido morta pelos índios tamoios. Ele conheceu o cacique Tibiriçá e, anos depois, construiu, no mesmo local onde existira a taba do glorioso índio, uma igreja em homenagem a São Bento. Aí levantou um pequeno santuário, que conservou, durante algum tempo, sob seus cuidados.

A 15 de abril de 1600, os oficiais da Câmara ratificaram, o que já havia sido feito por seus colegas, a Frei Mauro Teixeira:

"Carta de chãos de sesmaria, para o sítio do convento", por "constar ser como o dito padre diz e alega, por serviço de Deus Nosso Senhor e de seu servo, o bem aventurado São Bento", "os quais chãos serão para o convento, mosteiro, ou casa do dito santo, fôrros livres e isentos de todo tributo e pensão, de hoje até o fim do mundo".


É interessante destacar o papel do Mosteiro de São Bento na aclamação de Amador Bueno como rei de São Paulo, episódio histórico que assinala o primeiro grito de independência em terras do Brasil. Evitando aqueles que queriam fazê-lo rei apressadamente, rumou em direção ao templo onde pretendia refugiar-se. Os paulistas seguem em seu encalço gritando: "Viva Amador Bueno, nosso rei", ao que ele replicou muitas vezes "viva o senhor D. João IV nosso rei e senhor, pelo qual darei a vida".

Graças a Fernão Dias Pais, foi construído um novo templo. Em janeiro de 1650, foi lançada a pedra fundamental para sua construção. O bandeirante reconheceu "a pequenez do mosteiro e o aperto em que estavam os monges". Em troca, os religiosos "lhe davam a capella-mór da dita igreja para elle e todos os seus herdeiros e descendentes que apoz elle vierem e descenderem, n´aquella capela-mór se faria um carneiro para elle e todos os seus herdeiros legítimos serem sepultados…". As imagens de São Bento e Santa Escolástica que vemos hoje na atual basílica, da autoria de Frei Agostinho de Jesus, datam desta época. Os restos mortais de Fernão Dias Paes e de sua esposa se encontram na cripta do mosteiro.

Um recenseamento de 1798 traz os bens materiais do Mosteiro de São Bento, adquiridos por compra ou doação: Fazenda de Parati, em Mogi das Cruzes; terras no sertão de Taquaraé, doadas por Violante de Siqueira; terras com 61 cabeças de gado doadas por Fernão Dias Paes; a Fazenda São Bernardo, doada; terras em Ipiranga com 16 cabeças de gado e um cavalo; campo doado em Curitiba com cem vacas e 122 escravos, além de dinheiro e escravos. 

Mas, em meados do século seguinte, o Mosteiro de São Bento já apresentava sinais de decadência e abandono. O mosteiro, relata o historiador Ernani Silva Bruno, "com setenta e uma casas de morada na cidade, quatro fazendas e uma olaria, e mais de cem escravos, era morada de um único religioso". 

1860

Em Julho de 1900 D. Miguel Kruse assume a direção do mosteiro e, com atividade ímpar, inicia um novo período na história de São Paulo. Seus primeiros esforços são no sentido de dotar o mosteiro de um bom colégio secundário. Surge assim, em 1903, o Colégio de São Bento. Logo após, em 1908, funda a faculdade de Filosofia, que seria a primeira do Brasil. Em 1911, instala a primeira abadia de monjas beneditinas da América do Sul, o Mosteiro de Santa Maria.

1903

1910

É também de iniciativa de D.Miguel Kruse a construção de uma nova abadia e um novo mosteiro. Em 1910 tem início a nova construção segundo projeto do arquiteto Richard Berndl da cidade de Munique, Alemanha. Dizem que o relógio alemão, instalado em 1921, só parou uma vez, em 8 de janeiro de 1980, data que coincide com o falecimento de Júlio Müller, o único relojoeiro da cidade que sabia lidar com ele. 

Relógio do Mosteiro. Foto de Foto-diletantismo (http://www.flickr.com/foto-diletantismo).
Foto de Militão Augusto de Azevedo. 1862.

Quatro anos mais tarde, em 1914, estava completado o conjunto beneditino que conhecemos hoje abrigando a Basílica de Nossa Senhora da Assunção, o Mosteiro e o Colégio de São Bento, marco histórico, cultural e turístico da maior importância para o cidade de São Paulo e para o Brasil.

1916
Escadaria de São Bento e parte do Viaduto de Santa Efigenia - 1916

O Mosteiro de São Bento localiza-se no Largo de São Bento, região de intenso comércio, onde, em 26 de setembro de 1975, foi inaugurada a Estação São Bento do Metrô.

Mosteiro de São Bento. Foto de Foto-diletantismo (http://www.flickr.com/foto-diletantismo).

Confederação dos Tamoios

A Confederação dos Tamoios é a denominação dada à revolta liderada pela nação indígena Tupinambá, que ocupava o litoral brasileiro entre Bertioga(SP) e Cabo Frio(RJ), e envolveu os portugueses, os franceses e as tribos indígenas dos Guaianazes, Aimorés e Termiminós, entre 1556 e 1567, embora tenha-se notícia de incidentes desde 1554.

O nome dessa confederação vem do vocábulo tupi antigo tamyîa (ou tamuîa), que significa "avô" ou "antepassados".

O governador da capitania de São Vicente, Brás Cubas, pretendia promover a colonização mediante a escravização de indígenas. Entre as práticas indígenas, estava o cunhadismo, pela qual um homem, ao se casar com uma mulher de uma determinada tribo, passava a ser membro dessa mesma tribo. Por essa prática, João Ramalho, companheiro de Brás Cubas, desposou Mbici, também conhecida como Bartira, filha do chefe dos tupiniquins, o cacique Tibiriçá. Através dessa parceria, João Ramalho angariou um grande número de aliados para um ataque à aldeia dos tupinambás, na tentativa de aprisioná-los e usá-los como mão de obra escrava.  Nesta época os colonizadores procuravam mão de obra escrava para trabalhar nas primeiras plantações de cana-de-açúcar. Além do grande número de mortes, muitos índios foram presos por ordens de Brás Cubas, entre eles o chefe da tribo, Cairuçu e o seu filho Aimberê.

Preso em péssimas condições de sobrevivência, o tupinambá Cairuçu acabou morrendo no cativeiro. Seu filho, Aimberê, conseguiu fugir e assumiu o comando da tribo e declarou guerra aos colonos portugueses e à tribo dos tupiniquins.

Aimberê reuniu-se onde hoje é Mangaratiba, no litoral oeste fluminense, com os demais chefes tupinambás: Pindobuçu e Koaquira, de Ubatuba, Cunhambebe, de Ariró, Guayxará, de Taquarassu-tyba. Sob a liderança de Cunhambebe e com o apoio de outras nações indígenas, como os goitacás, os tupinambás organizaram uma aliança contra os tupiniquins e portugueses.

Nesta mesma época, em 1555, desembarcaram no Rio de Janeiro os franceses, liderados por Nicolau Durand de Villegaignon, que logo se aliaram aos Tamoios contra os lusitanos oferecendo a estes armas em troca da permanência em terras brasileiras. Os franceses queriam fundar a França Antártica, um território para todos que eram perseguidos em seu país.

Cunhambebe marcou história devido a suas grandes batalhas contra os portugueses. Faleceu após um surto de doenças contraído pelo contato com os brancos, foi então que Aimberê ocupou o seu lugar. Ele fez contato com o líder Tibiriçá, através do sobrinho Jaguaranho, e marcou um encontro para selar a confederação. Quando os tamoios chegaram na aldeia, Tibiriçá se declarou fiel aos portugueses e matou seu sobrinho, suscitando uma investida que dizimou grande parte da tribo dos guaianases.

Em 1563 foi efetuado um tratado de paz entre os portugueses e os índios tamoios. Para negociar o tratado, os jesuítas Manuel da Nóbrega e José de Anchieta se deslocaram em 1562 até Iperoig (atual Ubatuba), onde estava o líder tamoio Cunhambebe. Nóbrega acompanhou Cunhambebe até São Vicente, onde o líder tamoio iria negociar com os portugueses e tupiniquins, enquanto Anchieta ficou em Iperoig como refém dos tamoios. Durante esse período como refém, Anchieta compôs, na areia da praia, seu célebre poema em latim em honra à Virgem Maria, o "Poema da Virgem".

Anchieta e Nóbrega na Cabana de Pindobuçu. Pintura de Benedito Calixto

O fim da trégua conquistada pelo armistício de Iperoig em 1563 se deu com o fortalecimento da colonização portuguesa, com os portugueses se lançando sobre as aldeias indígenas, matando e escravizando a população. Os tupinambás foram se retirando em direção à baía de Guanabara.

Contudo, em 1567, com a chegada de reforços para o capitão-mor Estácio de Sá, que fundara, dois anos antes, a vila de São Sebastião do Rio de Janeiro, iniciou-se a etapa final de expulsão dos franceses e de seus aliados tamoios da Guanabara, tendo lugar a dizimação final dos tupinambás e a morte de Aimberê quando da guerra de Cabo Frio.

A confederação dos Tamoios é relatada, em parte, nos escritos do mercenário alemão Hans Staden, que foi prisioneiro dos tamoios em Uwa-tibi, aldeia tupinambá que ficava em algum ponto do litoral entre a Bertioga e o Rio de Janeiro atuais.

Bandeira da cidade

A bandeira da cidade de São Paulo, juntamente com o brasão e hino, constituem os símbolos do município de São Paulo.

A bandeira paulistana é retangular branca, nas proporções de 14:20 (altura:comprimento) e traz a Cruz da Ordem de Cristo em vermelho em braços alargados e ostenta o brasão do município no centro sobre círculo de branco que está debruado de vermelho.

Foi instituída em 5 de março de 1987 pelo prefeito Jânio Quadros através da lei 10.260, sendo posteriormente regulamentada através do Decreto nº 23668/1987 e alterada pelas leis lei nº 13331/2002 e nº 14.472/2007, mas sempre mantendo o formato original. Antes dela, a bandeira era toda branca com o brasão da cidade ao centro.

A atual composição da bandeira, das cores utilizadas e seus significados são dados pelo artigo 6º da lei nº 14.472/2007. Essa mesma lei, também consolida a legislação municipal sobre honrarias e símbolos, como brasão e o hino.




SIGNIFICADO

O branco simboliza a paz, a pureza, a temperança, a verdade, a franqueza, a integridade, a amizade e a síntese das raças que, amalgamadas, dão pujança à cidade de São Paulo, e a cor vermelha é indicativa de audácia, coragem, valor, galhardia, intrepidez, nobreza conspícua, generosidade e honra. A cruz evoca a fundação da Cidade à sombra do Colégio dos Padres Jesuítas e, por ser a da Ordem de Cristo, alude aos primórdios da colonização do Brasil, época em que surgiu São Paulo. É o círculo emblema da eternidade, afirmando ânimo de que se investem os munícipes de defender a perene posição de São Paulo como Capital e Cidade Líder de seu Estado.

A PRIMEIRA BANDEIRA 

A primeira referência que se têm sobre às bandeiras paulistas vem das expedições desbravadoras que o povo desta então capitania realizava, partindo da capital muitas vezes entre o século XVII e XVII, não por acaso denominadas, genericamente de bandeiras, e seus membros eram os bandeirantes, as suas expedições aumentaram consideravelmente o espaço geográfico do Brasil. O termo bandeirantes se deve ao fato das expedições serem sempre conduzidas por uma bandeira com as insígnias representativas do chefe da expedição ou mesmo a bandeira da Cruz de Cristo, conforme consta do brasão da cidade de São Paulo e do Estado de Mato Grosso.

Bandeira com símbolo da Ordem de Cristo

O autor Benedito Bastos Barreto lembra em sua obra de referência sobre o assunto que "no começo do século, em 1603, não existia em São Paulo nenhuma bandeira da cruz da Ordem de Cristo" mas que no começo deste citado ano foi requerida uma bandeira para Câmara. De se lembrar que neste tempo Portugal estava anexado à Espanha e que os bandeirantes, ao usar tal bandeira mostravam-se fiéis às suas origens lusitanas.

Primitivo Paço Municipal da Villa de São Paulo de Piratininga em 1628.
Pintura de José Wasth Rodrigues

BRASÃO

O brasão do município de São Paulo foi criado oficialmente pelo ato Municipal nº 1057, de 8 de março de 1917, sendo assim descrito pela citada norma:

“Escudo português de goles com um braço armado movente do flanco sinistro empunhando um pendão de quatro pontas farpadas ostentando uma cruz de goles, aberta em branco sobre si, da Ordem de Cristo, içada em haste lanceada em acha d’armas, tudo de prata. Encima o escudo a coroa mural de ouro, de quatro torres, com três ameias e sua porta cada uma. Suportes: dois ramos de café, frutificados, de sua cor. Divisa: "Non ducor duco”, de goles, em listão de prata".


Criado em 1916, durante o governo municipal de Washington Luís, o concurso para escolha do brasão teve como vencedor o desenho de Guilherme de Almeida e José Wasth Rodrigues. Posteriormente, com algumas alterações solicitadas pela comissão julgadora, o brasão foi oficializado em 8 de março de 1917.

O uso do brasão foi restabelecido pela Lei Municipal 3 671, de 9 de dezembro de 1947, após ter sido suspenso, assim como outros símbolos municipais e estaduais, pelo governo federal durante o Estado Novo.

Nos anos de 1950 era usada, extra-oficialmente, como bandeira paulistana o referido brasão em um pano branco. Como o brasão apresentava diversas falhas heráldicas, como por exemplo, apresentar a coroa mural com três torres visíveis, ao invés de cinco, como no caso de município sede de comarca o mesmo foi refeito.

O brasão da cidade de São Paulo, foi redesenhado e reestilizado para correção de uma falha em termos de leis internacionais de heráldica, a pedido do prefeito Jânio Quadros em 1986, e foi instituído em 6 de março de 1987. Desde então a definição dos símbolos não foi alterada, apenas as normas de seu uso foram complementadas por leis subsequentes. A lei atualmente em vigor que regulariza os símbolos municipais é a 14472 de 2007.

O símbolo é formado por um escudo com um braço empunhando a bandeira da cruz de cristo usada pelos navegantes portugueses simbolizando a fé cristã. Sobre ele, há uma coroa de cinco torres visíveis (sendo 8 no total), símbolo de uma capital de estado. As laterais são adornadas por ramos de café: o principal fator da economia paulista na época.

A divisa NON DVCOR DVCO quer dizer Não sou conduzido, conduzo, e valoriza a independência das ações desenvolvidas pela cidade e seu papel de liderança no estado e no país.

Incrivelmente, o município de São Paulo, ainda não tinha, nesta época, uma bandeira oficial, extra-oficialmente, ainda era usada como bandeira paulistana o brasão centrado sobre em um pano branco.


O brasão da cidade de São Paulo possui um erro comum na heráldica municipal (também denominada "civil") brasileira, que é a representação incorreta da peça conhecida como "coroa-mural" (a peça de cinco torres logo acima do escudo).

O erro está na utilização da cor vermelha (goles) nas portas das torres, em detrimento do correto, que seria a cor preta (sable). Não se utiliza de forma alguma cor vermelha como a que está representada no atual desenho. É uma simples "licença artística", adotada, sugerindo portas abertas, sinal de espírito acolhedor do cidadão do município. Nem mesmo essa orientação é correta, pois a representação de portas abertas em heráldica é a cor branca, e não a vermelha.

1561 a 1580

1561

A vida municipal de São Paulo do Campo de Piratininga se iniciou sob as mais graves apreensões. Em 20 de maio, a Câmara da nova vila pedia ao Governo-Geral armas e reforço de povoadores à vista das contínuas e fortíssimas agressões dos índios à sua aldeia mal amparada pelas mais singelas e expugnáveis muralhas.

A situação instável daqueles tempos obrigou a recém-criada vila de São Paulo a se preparar militarmente, como se pode ver nessa petição ao rei, pela qual seus moradores solicitavam armas para a defesa da vila, e que o produto do dízimo fosse gasto em fortificá-la, pedindo “que venham degredados para povoar a terra, contanto que não sejam ladrões”.

Ser condenado à pena de degredo durante o Antigo Regime português consistia, antes de tudo, em ser obrigado a permanecer por um tempo determinado num local específico prescrito pelas autoridades judiciais lusitanas. Tribunais civis e inquisitoriais estabeleciam as condenações, baseados nos livros das Ordenações do Reino ou do Regimento do Santo Ofício da Inquisição. Dessa forma, criminosos e pecadores foram expulsos de suas terras natais e pagaram por seus delitos em terras localizadas em alguma das possessões portuguesas do além-mar, ou mesmo dentro do próprio território fronteiriço do Reino.

1562

Dois anos depois da organização das primeiras aldeias coloniais, em 1562, ameaças, mortes de homens brancos, captura de escravos, capturas de mulheres, levantes e guerras foram ações contínuas de vários grupos indígenas “desinquietos” que viviam tanto nas aldeias coloniais como no sertão. Embora seja difícil identificar todos os grupos implicados nos conflitos, a documentação da Câmara identifica, entre os atores, os Tupiniquim de Ururaí, de Pinheiros e do sertão, os Carijó do Sul, que buscavam mulhres brancas, os Tamoios do litoral do Rio de Janeiro, e grupos “contrários” do sertão que se “alevantaram” contra os adventícios, como os Guanonimis ou Maromimi(Guarulhos), os das nações hybirababacas, provavalmente os Caiapó, e os Guaianá.



Ata da Câmara paulistana de 01/01/1562, descrevendo o rito pelo qual 
se dava a escolha dos vereadores e demais autoridades que 
serviriam a edilidade no ano de 1562.

Além das armas, a vila precisava de um baluarte de defesa. Em abril, agravou-se a situação e João Ramalho foi eleito pela Câmara e povo, capitão da gente de guerra que devia enfrentar os índios agressores. Depois do ataque dos Tupinikim, a 12 de junho de 1562, foi iniciada a construção de um muro de taipa.

Em 10 de julho de 1562, uma coligação de tribos guaranis, carijós e outros tupis, a que se deu o nome de Confederação dos Tamoios, investiu contra a vila. No embate, os sitiados, comandados por João Ramalho e Tibiriçá, ganharam a batalha graças à superioridade (embora ainda não muito considerável) na época, das armas de fogo de tiro muito lento e pequeno raio de alcance. Contra si tinham a grande inferioridade do número de combatentes. Rechaçados os tamoios com grandes perdas, reiteraram o ataque a 11 de julho com redobrado vigor. Viram-se, porém, completamente derrotados e debandaram, perseguidos pelos vencedores, brancos e índios. Foi então que Nóbrega e Anchieta se ofereceram como parlamentares junto aos tamoios, permanecendo na praia de Iperoig (atual Ubatuba), como reféns durante meses, até que se estabelecesse a paz entre brancos e gentios.

Anchieta e Nóbrega na Cabana de Pindobuçu. Pintura de Benedito Calixto

Em novembro deste mesmo ano foi nomeada uma comissão de 12 pessoas, para concluir a fortificação, sob pena de pagar uma multa de “cyncuo [cinco] tostois . Desta forma vê-se que as ordens deviam ser cumpridas e de forma autoritária.

Com o passar do tempo, as hostilidades desencadeadas pelos indígenas foram cessando. Ao invés de proteger a vila, este muro dificultava as idas e vindas das pessoas para suas roças, surgindo aberturas de passagens que o deterioravam. Sem ter quem o reformasse, foi destruído pela ação do tempo. No final do século já não há mais referência a ele. 

Apesar deste incipiente baluarte, poucos moradores viviam na vila, estando a maioria na zona rural. Esses homens rudes, muitos deles aventureiros e com uma família mestiça, optaram pelo isolamento rural, que lembrava a aldeia tupi. O sítio e a fazenda sobrepujaram a cidade. Poucas casas havia na vila, e eram usadas apenas para negócios de final de semana, por ocasião das festas religiosas e procissões e quando vinham participar das sessões da Câmara.

Tão pequeno lugarejo não comportava grande aparelhamento administrativo e judicial. Desde os primeiros anos temos ciência da presença de um notário tabelião de notas chamado João Fernandes. Acumulavam os tabeliães quinhentistas o cargo notarial com o de escrivães das Câmaras.

O Cacique Tibiriçá viria a morrer naquele mesmo ano, vítima da "peste negra", no dia de Natal, e foi muito chorado pelos jesuítas que o sepultaram.

1564

Numa sessão de 1564, a Câmara de S. Paulo afirma que os Tupiniquim e os Tamoio têm causado muita apreensão na vila de São Paulo e solicita ao Rei que autorize a guerra contra os índios. Os Tupiniquim, dita o documento, há quinze anos têm matado homens brancos no sertão. No âmbito da vila, quebraram as pazes, atacaram e fizeram um cerco de alguns dias em torno do vilarejo de São Paulo. Há dois anos, seguem fazendo saltos “destroindo hosmãotimentos e matãodo e levãodo allgus homes brãoquos e escravos e assim muito do guado vaqu [...]”

Ocorreu nova e grande tensão entre os moradores da vila e índios hostis, cujo chefe militar continuava a ser João Ramalho, que neste ano afastou-se da vila paulistana. João Ramalho resolveu abandonar o Planalto e ir morar longe. E foi habitar uma cabana rústica no vale do Paraíba. Hospedou-se em casa de Luís Martins.

Estava velho e cansado. Apesar de tudo, embora na quadra dos setenta anos, não tinha uma cã (cabelos brancos) na cabeça nem no rosto, e costumava andar nove léguas a pé antes de jantar.

No dia 15 de fevereiro de 1564, um grupo pacífico de homens foi procurá-lo na sua casa. João Ramalho recebeu-os com certo embaraço. Que queriam dele? Mandou-os entrar.

Não havia banco para tanta gente. Ficaram de pé, e de pé falaram. Era uma comissão do Conselho Paulista. Vieram comunicar-lhe que a gente de Piratininga o havia eleito para vereador de sua Câmara. Ramalho ouviu tudo com a maior atenção. Seu olhar parecia andar por muito longe, distante mesmo... Lembrava-se, talvez, das ingratidões de que fora vítima.

Recordava-se das humilhações sofridas. E então solene, pausado, com um tom superior, retorquiu, altivo:

"Não aceito. Vivo bem no meu exílio. Pra que voltar? Além disso, estou velho: sou um homem que já passou dos setenta anos... Digam ao Conselho que João Ramalho declina da honraria, e prefere ficar onde se encontra: prefere acabar seus dias entre os contrários do Paraíba, na terra dos índios." 

1565

Havia trigais em torno do arraial e muito gado. Em torno do Colégio de São Paulo existiam seis aldeias de índios da terra e umas tantas casinhas esparsas de moradores, cristãos uns e outros não.

1571

A atual rua de São Bento era o delineamento principal da vila. Já se assinalavam os dois outros rumos do famoso Triângulo de nossos dias. A Câmara empenhava-se em demarcar o seu rocio.


1572

Em 1572, os camaristas reclamaram que algumas pessoas haviam reunido os índios “põtteiros” para levar ao Rio de Janeiro, o que não consentiam, alegando “ser prejuízo da ttera”, por “não tteremos quem corra as frõtteiras” e por terem “nottiçia dos conttrairos estare juntos”. Diante do “estado de guerra” da Capitania de São Vicente e da ameaça de despovoamento da Vila de São Paulo, a Câmara pede que o “gentio seja conquistado p.r guerra p.a q co medo e co ho quastigo q lhe pode dar fique co menos forsa p.a poderem cometer a dita vila e capitania como custumão”. A articulação de uma guerra contra os índios do sertão fez-se simultaneamente às medidas de defesa dos 1.500 moradores da vila de São Paulo, distribuídos por 190 fogos.

Os oficiais ordenam a limpeza dos caminhos e das fontes, a construção de pontes, a contratação de um porteiro da vila e a contratação de vigias e espias que informem os movimentos dos grupos inimigos.


Também recomenda que se retirem os chiqueiros de porcos e as casas que estiveram arrimados aos muros da vila, “p.r q sosedendo allgua guera pellos ditos chiqueiros podiam subir os contrairos”


1575

Cristóvão Gonçalves tinha uma olaria que trabalhava com aplauso da Câmara pois “a dita telha era necessária por razão desta vila estar coberta de palha e correr risco por razão do fogo”. Estava em andamento a construção do primeiro paço municipal e o indefectível cárcere a ele anexo. Tão má a sua construção que em 1583 começou a ruir.

1576

Devendo a Câmara pagar vinte cruzados, declarava não poder fazê-lo em moeda de contado, que a esta não possuía, e sim em couros, toicinho, porcos e cera.

A forca era um instrumento da justiça, pois na época havia pena de morte. Com uma população formada por aventureiros de toda espécie, deve ter sido usada com certa freqüência. Por isso foi levantada antes do pelourinho, em 1576. Não era bem vista pelos paulistas, que pouco interesse tinham em levantá-la. Naquele ano os vereadores pediam “q’ suas mercês mãdacen allevantar a forqua q’ estava no chão toda caída”.

1580

Em 1580 morreu João Ramalho, em seu exílio voluntário.

Na vila de São Paulo, a superintendência da polícia de costumes procurava acabar com as orgias e desordens de índios e brancos. Também tomaram-se providências contra linguarudos e caluniadores “alguns homens que eram difamadores, sobretudo os que difamavam mulheres casadas e solteiras”. Foram diversos destes maledicentes enxotados da república.

Santo Amaro

Em 1560, o padre José de Anchieta, durante uma de suas visitas ao aldeamento também conhecido como Nossa Senhora da Assunção de Ibirapuera - localizado na sesmaria de Jeribatiba -, propôs que se constituísse no local um povoado, visto o grande número de índios catequizados e colonos portugueses. Ainda no ano de 1560, no ponto central desse povoado foi construída uma capela que, após a doação feita pelo casal João Paes e Suzana Rodrigues de uma imagem esculpida em madeira de Santo Amaro, foi consagrada para sua veneração. A imagem encontra-se ainda hoje guardada na igreja matriz do bairro.